2 de out. de 2012

Qual o papel do vereador?




Tenho andado muito pela cidade, e uma coisa me vem tirando o sono: o pouco interesse das pessoas pelo processo eleitoral, talvez por causa dos seguidos escândalos, ou pela falta de informações sobre o papel do vereador. É triste presenciar a desmoralização da política, motivada por outros interesses que não o público.
Pelo que vemos, a descrença do povo decorre desses e de outros fatores, como a corrupção, e a constatação de que a Câmara não passa de um carimbador das decisões do prefeito, portanto, inútil, do ponto de vista prático.
É importante ressaltar que o próprio legislativo tem grande parcela de culpa nessa situação, estimulando o senso comum de que o vereador é um solucionador de problemas, uma espécie de síndico do bairro, responsável pela manutenção de ruas e calçadas.
Essa visão é equivocada. Temos papel fundamental nos rumos da cidade. Nossas atribuições vão muito além disso, o que muitos candidatos, alguns até bem-intencionados, desconhecem.
Os próximos quatro anos, por exemplo, serão decisivos para os rumos da cidade. São bilhões de reais em obras, com vistas à preparação da cidade para receber os grandes eventos, como a Copa do Mundo, as Olimpíadas e a Jornada Mundial da Juventude.
Essas intervenções prometem mudar radicalmente a cidade, de maneira que a aplicação desses recursos e suas consequências precisam ser debatidas. A especulação imobiliária, por exemplo, vem exercendo grande pressão em diversos bairros da cidade, como Jacarepaguá, Recreio dos Bandeirantes e Guaratiba.
Esses bairros não têm estrutura para receber o fluxo de pessoas que comprarem um dos milhares de apartamentos ou casas em condomínios fechados que proliferam na região.
A implantação de corredores BRT pela cidade afora é ótima, do ponto de vista da mobilidade urbana, mas terrível do ponto de vista dos moradores de bairros por onde os corredores passsarem, pois muitas ruas foram alargadas e isso vai ocasionar a perda de identidade desses lugares.
O impacto financeiro de intervenções como a derrubada do elevado da Perimetral não justifica os riscos que operações desse porte podem causar tanto ao trânsito quanto à vida das pessoas, já que um túnel será construído no lugar do elevado, um verdadeiro desperdício de recursos públicos.
O mundo não vai acabar em 2016. É preciso pensar a cidade para os próximos 30, 40, 50 anos. Essas discussões deveriam encontrar eco na Câmara Municipal, mas, salvo raras exceções, a influência do poder executivo é tão expressiva que praticamente inviabiliza o debate sobre os rumos do Rio.
Para que esse confronto de ideias acontecesse, teríamos de assumir uma posição de independência frente ao Executivo, o que tem sido absolutamente impossível em um governo que conta com o apoio de 20 partidos.
Sabemos que uma base de apoio tão grande consegue aprovar muita coisa sem discussões. É tudo o que o prefeito quer. Porém, devido às alterações profundas na estrutura da cidade, o debate precisa acontecer. 
Como vereadores, não podemos fugir do nosso papel principal de fiscalização dos atos do prefeito. Entretanto, precisamos ter uma visão mais ampla da cidade e das consequências dos nossos atos aqui nesta casa, já que irão repercutir em todo o município.
Deveríamos fazer uma autocrítica e avaliarmos se estamos de fato agindo de acordo com o interesse público.

Outro ponto que deveríamos destacar é se estamos conseguindo comunicar corretamente a importância da figura do vereador em uma cidade que já foi sede de império, distrito federal, cidade-estado e hoje administra um orçamento de fazer inveja a muitos países, sendo uma das primeiras em termos de arrecadação em todo o Brasil.
A sociedade também precisa se engajar e cobrar de seus escolhidos essa postura de fiscalização. Afinal, somos representantes dela, eleitos por ela. Para que tenhamos uma política limpa, os políticos têm que ser cobrados por suas atitudes, pelas decisões que tomam.
Grandes iniciativas, como a Lei da Ficha Limpa, não podem cair no esquecimento. A sociedade precisa fiscalizar. Quem pensa que o parlamentar é inútil e que a corrupção é normal faz o jogo dos maus políticos, que se aproveitam disso para praticar todo tipo de bandalhas.
Muitos de nós perdemos amigos e familiares na luta contra a ditadura. Conquistamos, graças ao suor de uns e sangue de outros, uma democracia que a duras penas vem se fortalecendo. 
Mas para que, de fato, tenhamos um país democrático, que garanta os direitos individuais, muita coisa ainda precisa acontecer. A reforma política, com o financiamento público de campanha, precisa ganhar a atenção da sociedade. Não é possível imaginar, infelizmente, que a decisão de mudar as regras do jogo vá partir da classe política.
Por fim, lembro que o Dia do Vereador foi celebrado nesta segunda (1°/10). Lamentavelmente, talvez devido às razões que expus aqui, a data não tenha sido lembrada sequer pelos nobres colegas da Câmara do Rio, tão importante para a sociedade carioca e, ao mesmo tempo, tão desgastada. 

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