Tenho andado muito pela cidade, e uma coisa me vem tirando o sono: o pouco interesse das pessoas pelo
processo eleitoral, talvez por causa dos seguidos escândalos, ou pela falta de
informações sobre o papel do vereador. É triste presenciar a desmoralização da
política, motivada por outros interesses que não o público.
Pelo que vemos, a descrença do
povo decorre desses e de outros fatores, como a corrupção, e a constatação de que a Câmara não passa de um carimbador das decisões do prefeito, portanto, inútil,
do ponto de vista prático.
É importante ressaltar que o
próprio legislativo tem grande parcela de culpa nessa situação, estimulando o
senso comum de que o vereador é um solucionador de problemas, uma espécie de
síndico do bairro, responsável pela manutenção de ruas e calçadas.
Essa visão é equivocada. Temos
papel fundamental nos rumos da cidade. Nossas atribuições vão muito além disso,
o que muitos candidatos, alguns até bem-intencionados, desconhecem.
Os próximos quatro anos, por
exemplo, serão decisivos para os rumos da cidade. São bilhões de reais em
obras, com vistas à preparação da cidade para receber os grandes eventos, como a Copa do Mundo, as Olimpíadas e a Jornada Mundial da Juventude.
Essas intervenções prometem
mudar radicalmente a cidade, de maneira que a aplicação desses recursos e suas
consequências precisam ser debatidas. A especulação imobiliária, por exemplo,
vem exercendo grande pressão em diversos bairros da cidade, como Jacarepaguá, Recreio
dos Bandeirantes e Guaratiba.
Esses bairros não têm estrutura
para receber o fluxo de pessoas que comprarem um dos milhares de apartamentos
ou casas em condomínios fechados que proliferam na região.
A implantação de corredores BRT
pela cidade afora é ótima, do ponto de vista da mobilidade urbana, mas terrível
do ponto de vista dos moradores de bairros por onde os corredores passsarem,
pois muitas ruas foram alargadas e isso vai ocasionar a perda de identidade
desses lugares.
O impacto financeiro de
intervenções como a derrubada do elevado da Perimetral não justifica os riscos
que operações desse porte podem causar tanto ao trânsito quanto à vida das
pessoas, já que um túnel será construído no lugar do elevado, um verdadeiro
desperdício de recursos públicos.
O mundo não vai acabar em 2016.
É preciso pensar a cidade para os próximos 30, 40, 50 anos. Essas discussões
deveriam encontrar eco na Câmara Municipal, mas, salvo raras exceções, a
influência do poder executivo é tão expressiva que praticamente inviabiliza o
debate sobre os rumos do Rio.
Para que esse confronto de
ideias acontecesse, teríamos de assumir uma posição de independência frente ao Executivo,
o que tem sido absolutamente impossível em um governo que conta com o apoio de
20 partidos.
Sabemos que uma base de apoio
tão grande consegue aprovar muita coisa sem discussões. É tudo o que o prefeito
quer. Porém, devido às alterações profundas na estrutura da cidade, o debate
precisa acontecer.
Como vereadores, não podemos
fugir do nosso papel principal de fiscalização dos atos do prefeito.
Entretanto, precisamos ter uma visão mais ampla da cidade e das consequências
dos nossos atos aqui nesta casa, já que irão repercutir em todo o município.
Deveríamos fazer uma autocrítica
e avaliarmos se estamos de fato agindo de acordo com o interesse público.
Outro ponto que deveríamos
destacar é se estamos conseguindo comunicar corretamente a importância da
figura do vereador em uma cidade que já foi sede de império, distrito federal,
cidade-estado e hoje administra um orçamento de fazer inveja a muitos países,
sendo uma das primeiras em termos de arrecadação em todo o Brasil.
A sociedade também precisa se
engajar e cobrar de seus escolhidos essa postura de fiscalização. Afinal, somos
representantes dela, eleitos por ela. Para que tenhamos uma política limpa, os
políticos têm que ser cobrados por suas atitudes, pelas decisões que tomam.
Grandes iniciativas, como a Lei
da Ficha Limpa, não podem cair no esquecimento. A sociedade precisa fiscalizar.
Quem pensa que o parlamentar é inútil e que a corrupção é normal faz o jogo dos
maus políticos, que se aproveitam disso para praticar todo tipo de bandalhas.
Muitos de nós perdemos amigos e
familiares na luta contra a ditadura. Conquistamos, graças ao suor de uns e
sangue de outros, uma democracia que a duras penas vem se fortalecendo.
Mas para que, de fato, tenhamos
um país democrático, que garanta os direitos individuais, muita coisa ainda
precisa acontecer. A reforma política, com o financiamento público de campanha,
precisa ganhar a atenção da sociedade. Não é possível imaginar, infelizmente,
que a decisão de mudar as regras do jogo vá partir da classe política.
Por fim, lembro que o Dia do Vereador foi celebrado nesta segunda (1°/10). Lamentavelmente, talvez devido às
razões que expus aqui, a data não tenha sido lembrada sequer pelos nobres
colegas da Câmara do Rio, tão importante para a sociedade carioca e, ao mesmo
tempo, tão desgastada.
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